Eu sempre fui curioso, aquele tipo de criança que ficava desmontando e montando brinquedos e xeretando as ferramentas do meu pai. Quando me interessava por algum objeto, imediatamente queria segurá-lo e, por isso, ouvi muito a frase: “tem olhos na mão, por acaso?”.
Acho que daí que surgiu minha afinidade por Design. Parecia interessante poder criar meus próprios objetos, meus próprios livros, mexer em várias coisas para no fim achar uma solução para algo. E realmente foi mais ou menos assim. Durante a universidade de Design Gráfico, eu tive contato com muito processo manual, tive aulas de Lettering e Caligrafia, tipografia com tipos móveis — muita coisa que vem da tradição do Design Gráfico, algo que não teria em um curso de Design Digital (que cogitei cursar no início).
Durante a minha graduação passei por aulas na Oficina Tipográfica. Foi lá que fiz meu primeiro contato direto com os tipos móveis, e comecei a ter uma relação muito diferente com a tipografia. Os tipos móveis são letras entalhadas em madeira ou metal, cada letra é um objeto tangível, de dimensões determinadas e únicas, para cada família tipográfica e para cada tamanho de tipo é necessário entalhar uma nova letra.
Essa característica da tipografia móvel cria uma dificuldade que não temos quando lidamos com programas como o Photoshop, Indesign ou o Microsoft Word, em que podemos alterar o tamanho de qualquer família tipográfica a vontade. Conhecendo mais sobre a tipografia móvel é que se entende porque quando abrimos esses programas as opções de tamanho sugeridas variam entre 12, 14 ,16, etc., e não números em sequência. Seria impossível entalhar uma letra para cada milímetro, então para organizar esse processo, surgiu o sistema de pontos, e o padrão de tamanhos que citei anteriormente.
Quando se compõe um texto usando tipos móveis, cada elemento de um texto é importante, até os espaços vazios são tangíveis na tipografia. O material branco, como é chamado, é tão importante quanto as próprias letras, porque não são pré-definidas como nos programas. É preciso pensar e calcular a relação entre o espaço vazio e os espaços ocupados por cada letra, o espaço entre cada palavra, cada linha, e cada parágrafo.
Essa experiência analógica cria algumas dificuldades, parece ter várias limitações de como usar a tipografia, mas na verdade desafia a criatividade a usar as limitações a favor do projeto, burlar as regras da tipografia, arranjar alguma gambiarra que vai fazer sua ideia dar certo, brincar com as letras e ter outras mil ideias diferentes do que se pretendia antes.
Além de criar conhecimentos únicos, o analógico traz outros benefícios para a criatividade, como desenhar. Afinal, desenhar um círculo em um software é fácil: é só puxar e a arrastar uma ferramenta e está pronto. Mas quando se faz desenhos de um protótipo de produto, por exemplo, é complexo demais puxar linhas e círculos no Illustrator para expressar sua ideia. Com isso, é muito mais rápido e eficiente desenhar à mão, apagar e refazer detalhes e, depois, finalizar nos programas.
Sempre que eu começo uma ideia em um papel parece que descubro mais possibilidades e soluções. Desenhar parece consolidar a forma do objeto na mente e facilita descobrir os defeitos do projeto. E isso se reflete em várias outras situações. Mesmo que eu já tenha testado vários aplicativos e formas de registrar alguma informação, como o Evernote, sempre acabo voltando para o caderno de anotações. Parece que usar as mãos sempre é um bom começo para ter boas ideias.
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